segunda-feira, 26 de março de 2012

Abênção do Anjo da morte

Eis que sou eu
O anjo da morte
Como calma fresta de manhã
Pela madeira das portas
Respirando bálsamos ao som dos pregos
Leves gemidos de melodias canoras
Do profundo vazio dos desertos de louça

Eis que sou eu
O anjo da morte
Asa de cera que não aquece
Nem ao menor nem ao grande
Deitados na relva de ventos
Acasos de fim de tarde antes da noite
Romaria pragmática dos sinédrios

Eis que sou eu
O anjo da morte
Candelabro de bronze fosco
De pouca luz e pouco aspecto
Madeira reluzente e escura
Da colcha nobre e de cama branca
Com rendas de neve e grânulos de milagre

Eis que sou eu
O anjo da morte
Máscara de jesso, manto de linho cinéreo
Silêncio nascente e desnaturado das videiras
Nas noites beijadas de inverno
Gélido sussurro frio de sentido
Calando o coração pelo arrepio

Eis que sou eu
O anjo da morte
Cachoeira sonora dos sinos das igrejas
No ensaio da meia noite de velas acesas
Velha cantilena das avós sobre a mesa
Os olhos abertos na madrugada que não dormem
Esperando alguém nunca chega

Eis que sou eu
O anjo da morte
Oração feita de terra e água
Enrolada em um terço no guarda roupas
Velha carta oculta embaixo da cama
Herança nos cofres de aluguel do corpo
Á pulcritude de seus versos



Eis que sou eu
O anjo da morte
A água mais salgada que se bebe
A mão mais gelada em que se toca
O pensamento que se esquece
Esquecida à hora em que se vai
De onde nunca mais se volta

Eis que sou eu
O anjo da morte
Leve sono de harpas e liras
Desde o princípio das coisas
Leve torpor de ébano e esmeraldas
Na vida eu começo
Como fim


WallMushu

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