sábado, 20 de fevereiro de 2016

Elióveli

A vida acabou para mim
Um início e fim de cortiça
A dor de cabeça sem fim
Ferina e mortal como o respeito
A pressão magoada nas temporas
Levemente a dormência da nuca
A vida acabou para mim
Um início e fim de cortiça

A vida acabou para mim
Como as grades da jaula de ouro
As portas escancaradas aberta ao voo
O pássaro fugirá sem dar adeus
O mundo se levantará como um avatar
Sem nem notar que faltei
Serei por fim algo que passou
E sem mesmo ter terminado eu passei

Como o eco da nota
Quando parou de tocar
Aqui estou

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

A cigana e o estranho

Senhor chegue mais perto
Vou contar-te um segredo
Eu posso ver presente e passado
Bem na palma da sua mão

Eu não estou mentindo

Mocinha eu bem sei
De toda a ciência antiga
Mas acho que você não vai gostar
Do que irá encontrar

Mas se quiser pode tentar

Me dê a sua mão
Vamos ver o seu destino
Eu vejo um passado tão distante
Quase quanto a criação

Isso nunca aconteceu antes

Eu tenho mais idade
Que a idade deste mundo
Eu sou o patriarca que atravessa
Toda essa geração

Da humanidade desde Adão

Eu vejo seu futuro
Sem um fim ou conclusão
Não posso acreditar no que estou vendo
É alucinação

Não existe ser universal

O fim e o começo
Bem na palma dessa mão
Eu venho transcendendo a existência
Desde antes do universo

Eu não tenho impressão digital

Isso não é possível
Bem eu devo estar confusa
As linhas e as fendas
Levam traços de uma herança oriental

O que está acontecendo?

As lindas e as fendas
São a origem mineral
As linhas mais suaves são segredos
Da matriz original

Que eu mesmo projetei

Todos tem um consenso
Em um Deus que é eterno
Mas nunca houve provas
De um ser humano que fosse imortal

Por favor fale a verdade

Eu ensinei a escrita
Bem como a astronomia
Eu enterrei segredos da magia
Na era medieval

Se quiser pode ver

Senhor não me machuque
Não me faça nenhum mal
Eu sou uma cigana quiromante
Apenas ganhando o pão

Eu nem sei o que dizer

Este coração
É a mais pura medicina
Você nunca me viu
E nunca te faria nenhum mal

Agora vá viver

O fugitivo enquanto olha o que deixou

Pálido rosto de brasão e linho comerciante
A terra parece correr mais para tras
Não olha! Ou te tornarás estátua virgem
De trêmula e covarde desistência
Foge da dependência da tua indecisão
Se foste teu crime tua liberdade abraça-o
Ama-o com o fogo com que o odeias
Odeia a ti mesmo, mas que te seja um elogio
Teu passado agora reluz como um mustruário
Belo e triste porém apenas enfeite das porcelanas
Agora estudas a cartilha branca dos refugiados
E o que leres não poderás dizer ou mostrar
Pois é segredo
Foge por entre as encostas rochosas
Onde os Maias fizeram sacrifícios
Enquanto pouco a pouco desenhavam o calendário
E esculpe nas lápides já desfeitas algum risco da tua passagem
Furor dos infernos, o mundo pesa nas tuas costas?
Não. Apenas deixa uma mensagem
Diz agora seres filho do que não tem nome
E do que não tem tempo contado
Teu céu será o hoje o que foi a mais de quinhentos anos
Quando os verdejantes prados não tinham telhados
Para e olha agora tua cidade comer o teu pecado
E dizer olhando ao alto que tem misericórdia
Oh misericórdia que te tornaste a lágrima do espectador
Que se compraz ao ver a dor
Que adora ser impotente e clamar ao Deus impossível
Já dizia o santo, que isso humanamente um dia
De tão triste seria possível
Se teu crime quebrou as tuas amarras
Honra a ele, mas não o sigas
Ele inicia os primeiros errantes
E enterra seus discípulos mais apaixonados
Entrega-te ao mundo ser teres endereço ou mesmo parada
Pois caçarão tua imagem e semelhança
Porque ninguém comete crime à luz do sol
Só nas malhas noturnas
Haverás de te confessar um dia
Chama por um padre depois da missa das sete horas
E conquista tua testemunha
Ao menos alguém lembrará de tua alma com doçura
E uma oração terás a advogar em teu julgamento
Esquece o passado
Pois sim, esquece o presente
Agora és nova criatura
Mas não te digo qual
Pois que elas subsistem da sombra
Do que um dia foi alma pura
Escolhestes assim, antes das algemas do teu casamento
E das tuas bodas de papel
Vede o longínquo e mantém a tua fé
Ela pode te operar o milagre de voar
Na envergadura do céu

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Aurora de ébano

Corre com teus passos de mudez
A noite avança na cavalaria da mensagem
Foste cifrada tua confissão e tua piedade
A moeda de troca de toda cavalaria
Foi teu ato de bondade
O fogo da rebeldia
Corre, luz elástica das auroras
Que sob o véu do alçapão estão escondidas
Com dores ainda usas o ato mágico
A desaparecer imerso em cordas
As areias da grande embarcação
Servirão como testemunhas
Oculares de sua escapatória
Heroica foi tua vida, e teus diários escritos
Agora enquanto meditas olhando os montes desertos
Armam para ti muitas armadilhas
Corre portanto, despede-te e odeia
As profecias lidas na tua mão
Morre se quiseres, mas ordeno-te outra vida
A vagares na fuga dos teus irmãos
Tua marca secular não te ignora
Assim como tua perna mancará como outrora
A terra apagará teus passos em agonia
Porque tua sombra relança um traço de luz
Tua marca secular não te ignora
E te denuncia
Ao veres o raiar do sol nos rostos recém despidos
Do sono ao beijar do dia
Te verão como te veem céus e quimeras
Todos enquanto no altar se ouve o fim da homilia
Para por um instante
Para e olha teu próprio semblante
E como envelheceste combalido da guerra
E nem mesmo relembras da tua mãe
Que te abençoou esperando teu regresso
Tua volta agora se converte em euforia
Porque marcaste o tempo e o passo da outra nação
Foste vigiado até mesmo pelas sombras esguias
Dos que dormiam bêbados pelo chão
Nem te lembras a promessa que amassaste na folha
E enterraste na terceira roseira do teu jardim
Espera porque te lanço uma segunda sorte
E te agarrarão com correntes e açoites
Tirarão boa parte da tua pele
E te deixarão a morrer na ultima prisão
Mas eis que eu tenho meus olhos por ti
E te tirarão na segunda hora da vigília
Te usarão os unguentos certos
E as ervas que deixarei
Terão paciência para que acordes
Então irão alardear tua fuga mítica
Te darão uma túnica, e te dirão o que deves fazer
Te darão um sobrenome e outra idade
E dirão de ti pelas ruas
Ficarás conhecido como se nascestes assim
Até que tua outra vida seja sepultada
Pelas notícias que farei correr
Logo mais poderás renascer em ti novamente
Para o golpe triunfal
Do triunfo me farei secreto
E serei sombra da tua vitória
Meu nome nunca será certo
E minha face jamais poderás contemplar
Sabereis apenas ser eu o âmago
De um ser humano que foi primordial
Uma matriz que não foi um sucesso
Mas que agora será
O que não deu certo
Agora dará

Aqueronte inundado

Eu roubei
A verdade iluminada do sol
Só pra poder lembrar deste universo
Quando ele um dia acabar

Eu roubei
Meia dúzia de gatos pingados no farol
Só pra poder esmolar algum pão amanhecido
E ver o dia acordar

Nós
Nós estávamos tentando reinventar o alfabeto
Com novas letras feitas de novo barro
Para um novo mundo ao qual iríamos entrar

Reunimos o que tínhamos do velho dialeto
Olhando para as fileiras matemáticas quando eu esbarro
Em um novo ponto gravitativo e central

Eu roubei
O ouro dos cabelos de Rapunzel
Só pra poder pintar as bordas da nova tela
Com que faria meu nome imortal

Eu robei
As moedas antigas perdidas no mar
Só pra poder mostrar ao mundo o seu comercio
E sua  ansiedade anormal

Nós
Nós esperamos chegar as novidades
Vindas do oculto do hemisfério oriental
Lapidadas pelas deidades

Ficamos dias e dias contando as estrelas do céu
Até chegar em um número fora das equações
Até perdermos a noção da hora em um sonho cheio de inundações

Eu roubei
As idades do homem mais velho
Só pra poder descortinar as eras
E palestrar como quem esteve lá

Eu roubei
O anel esquerdo dos anciões do fim dos dias
Só pra poder me revestir de poder
E poder  ter razão no meu julgar

Nós
Nós vemos o Aqueronte inundado dos nossos atos
Arrebatando milhões de almas cativas e inocentes
Com a nossa descoberta mortal

Vemos o nosso nome lapidado no barco
Como um troféu a toda nossa ousadia
De dissecar o sobrenome de Platão

Nós
Nos confins da terra diante do mar de fogo
Sentimos medo e sentimos arrependimento de tantos cálculos medievais

Nós
Tentamos em vão uma nova fórmula de atraso do tempo
Para quem sabe voltar a infância e separar nossos pais

Nós
Vimos o inferno perder sua forma e ficar oval
Quente e frio até demais

Nós
Seremos apagados dos tempos imemoriais
Até o ontem e o nunca mais